Marcos Menezes comenta esforço para trazer tratamento inovador no SUS

Médico Marcos Menezes comenta sobre método inovador e minimamente invasivo para tratar o câncer

Recentemente, médicos do Instituto do Câncer do Estado de São Paulo (ICESP) afirmaram que aguardam ansiosos pela chegada de 60 agulhas doadas à instituição. Além disso, o motivo de celebração diz respeito a um estudo inédito em que cada uma dessas agulhas será utilizada em um paciente com metástases pulmonares de um câncer extremamente agressivo, o sarcoma.

Marcos Menezes
Dr. Marcos Menezes

De acordo com o médico Marcos Menezes, em relação às metástases pulmonares, “se o câncer se espalhou, uma das saídas é fazer quimioterapia”. O especialista disse ainda que o tratamento pode destruir “aquelas células malignas que escaparam e que estão na circulação. No entanto, mesmo que os nódulos metastáticos nos pulmões respondam às drogas quimioterápicas, eles dificilmente irão desaparecer. Por isso, a indicação é fazer uma cirurgia para retirar esses tumores”.

Agulhas para pesquisa inédita

Ainda segundo a pesquisa inédita, o certo seria considerá-las como antenas. Isso porque quando são guiadas por imagens de tomografia até atingirem o interior do nódulo maligno, elas emitirão micro-ondas para aquecê-los do meio para a superfície. Sendo assim, por meio dessas antenas compridas sairão ondas eletromagnéticas capazes de agitar as moléculas de água ali presentes. Porém, ao agitar a tal ponto que a fricção entre elas irá gerar calor, trata-se de alcançar depressa algo entre 140 e 150 graus Celsius.

Sendo assim, conforme explicação do radiologista intervencionista Guilherme Lopes Pinheiro Martins, que conduzirá o estudo chamado BORIS:

“Com uma temperatura dessas, um tumor de 3 centímetros de diâmetro não leva mais do que uns 5 minutos para desaparecer.”

Ablação por micro-ondas

Neste caso, o ineditismo da pesquisa gira em torno da avaliação da ablação por micro-ondas nas metástases pulmonares de sarcomas. Até o momento, estes tumores não contam com boas alternativas de tratamento. Além disso, costumam acometer pacientes mais jovens, entre a adolescência e a faixa dos 30 anos de idade.

Vale recordar que o médico Marcos Menezes, ao lado do também radiologista intervencionista Raja Venkata, foram os primeiros a realizar em uma cirurgia o método de Ablação de Tecido por Micro-Ondas, em Goiânia. No caso, a intervenção ocorreu em um paciente de 66 anos de idade, vítima de um hepatocarcinoma (tumor primário de fígado).

Menezes explicou à época que, por se tratar de um tipo de tumor que possui pouca resposta à quimioterapia, “neste caso, foi preciso fazer realmente local. O paciente já havia feito uma quimioembolização, para redução do tumor, depois completamos o tratamento com a ablação por micro-ondas”.

Metástases nos pulmões

Contudo, o método de ablação por micro-ondas também gera enormes vantagens em outros tipos de metástases nos pulmões. Portanto, ele vem sendo cada vez mais realizado em alguns centros de oncologia dos Estados Unidos. Mas, especialmente em países europeus como Itália, Alemanha, Inglaterra e França, e também possui adesão no Japão.

O triste é que os nódulos tendem a voltar diz o especialista.

“Você tira um e, tempos depois, aparece outro. E ficar repetindo cirurgias é inviável.”

Isso ocorre porque o bisturi vai destruindo o tecido pulmonar sadio em seu trajeto até alcançar o ponto em que está o tumor para ser extraído. O tecido lesionado pelo caminho faz falta e é melhor acumular esses estragos.

E no Brasil?

Por outro lado, no Brasil, apesar de aprovado pela Anvisa, esse tratamento não integra o rol da ANS. Ou seja, nem os convênios particulares cobrem. Cada agulha custa em torno de R$ 20 mil.

E é exatamente por isso que Marcos Roberto Menezes, que atualmente é coordenador da área de radiologia e intervenção guiada por imagem do ICESP, diz sobre a importância do esforço que a instituição faz para “tratar pacientes do SUS com micro-ondas através de projetos de pesquisa como esse”.

Ele recorda ainda que dez a primeira ablação de um câncer por micro-ondas no Brasil, assim que foi aprovada em 2019 com dez anos de atraso em comparação aos países europeus.

Quando o câncer se espalha pelos pulmões

Células cancerosas crescem sem parar e desordenadamente. Ou seja, elas se descolam do tumor original, ou primário, e caem na corrente sanguínea. E podem parar em muitos lugares. Entretanto, os pulmões estão entre seus locais prediletos para se instalar. Além disso, todo o sangue passa por ali para ser oxigenado.

Por mais que o sangue pelo coração é nos pulmões que a circulação pega caminhos mais estreitos. E isso pode permitir trocas gasosas da respiração, afirma Menezes. No caso, a “célula maligna pode atravessar o vaso e se implantar no tecido pulmonar”.

Portanto, ao se instalar no pulmão, ela não vai querer saber se é de intestino ou de mama, por exemplo. Ou seja, cresce nesta região mesmo até formar um nódulo. Trata-se já de uma metástase — a porção doente de um órgão crescendo distante dele.

Radiologia intervencionista

Contudo, com os novos tratamentos, a sobrevida das pessoas aumenta. Porém, Menezes ressalta que não adianta tratar o câncer e derrubar o paciente. E quando se trata de pulmão, isso é crítico, ou seja, é necessário preservar o órgão.

Conhecida como radiologia intervencionista, ela consiste em utilizar equipamentos de radiofrequência para destruir esses tumores. Para Guilherme Martins, as micro-ondas possuem a vantagem de permitir a repetição do procedimento outras vezes. Portanto, a notícia é boa do ponto de vista que as metástases costumam voltar.

Outro ponto a favor das micro-ondas é que a radiofrequência não funciona tão bem nos pulmões, pois se baseia em criar uma corrente elétrica, a qual nunca tem boa condutibilidade no ar. E o que não falta nos pulmões é ar. Porém, as micro-ondas não sofrem interferência se o meio é sólido ou gasoso. As moléculas de água se agitam da mesma forma. Só precisam que o tecido a ser tratado esteja hidratado.

Quem pode passar pelo método de ablação?

A ablação por micro-ondas funciona quando o câncer já se espalhou. Mas ainda há poucos focos dele nos pulmões. Trata-se de casos oligometastáticos.

Sendo assim, Marcos Menezes se perguntou por que não utilizar o método de ablação quando um câncer nasce no próprio pulmão. Sobre isso, ele responde:

“No tumor primário, ela ainda é a melhor escolha. O cirurgião deve examinar toda a cavidade torácica e ainda tirar os linfonodos, para onde algumas células malignas podem ter sido drenadas.”

Sarcomas

No estudo com sarcoma, por exemplo, os 60 participantes devem ter no máximo cinco tumores metastáticos de até 3 centímetros, reunidos em um dos pulmões apenas ou divididos entre os dois.

Já em tumores malignos que surgem em partes moles do corpo (músculos, gordura, tendões e ligamentos), os sarcomas são bem raros. Ocorrem em aproximadamente cinco casos em cada 100 mil pessoas.

Martins diz ainda que quando são encontrados casos como estes em outras regiões do Brasil, esses pacientes são encaminhados para o ICESP.

“Por isso, acho que vamos conseguir os 60 casos para o estudo em dois anos. Outros centros talvez levariam dez, quinze anos.”

Artigo do ICESP

Todavia, os médicos do ICESP devem publicar um artigo com as informações de um estudo já concluído em que utilizaram a ablação por radiofrequência nos casos de sarcomas.

Mas, mesmo ela sendo cheia de limitações para tumores nos pulmões, o tratamento fez com que a porcentagem de pessoas com sobrevida de cinco anos fosse para até 60%. Ou seja, triplicou.

Expectativas

Os médicos possuem a expectativa de um resultado no mínimo igual com o uso de micro-ondas. Porém, eles não descartam um empate. Isso porque o procedimento com micro-ondas “é mais rápido e menos agressivo ainda”, diz Guilherme Martins.

No caso, o paciente é colocado na entrada de um tomógrafo, como se fosse fazer esse exame. A anestesia geral é dada por pura precaução, se houver alguma complicação rara, como sangramentos, que os médicos resolverão com maior facilidade.

A recuperação é menos dolorosa, afirma Martins. Alguns pacientes podem sentir incômodo ao puxar o ar nas primeiras 48 horas, principalmente se o nódulo destruído estiver próximo da pleura, a membrana inervada que protege o pulmão, esclarece.

“Quando é assim, na hora da ablação a gente até injeta ar ou soro para afastá-la um pouco e poupá-la do calor.”

Por fim, o tratamento só está disponível para fins de pesquisa no SUS. Mas, se surgirem mais focos de metástase amanhã ou depois, os pacientes poderiam se submeter a uma nova ablação por micro-ondas. Isso porque terão pulmões preservados para isso e literalmente fôlego para continuar na batalha, revela o especialista.

*Foto: Reprodução